Outro Tempo

Porque às vezes mais não é suficiente

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

 
9º.
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Continuo desinspirado. Quando não se encontra o fio da escrita, não adianta. Nada me sabe, nada me apetece. Aceitem, senhores, o que se segue como rascunho, para ler, eventualmente sorrir, e depois deitar fora. Fica para depois a literatura dos mitos.
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Frederico Garcia
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Minha casa têm
Como pedra d’armas
Ai dois corações azuis
São de vidro coloridos
Ai dois corações azuis
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Meu rio corre
Sinuoso pelo vale
Ai azul como ele corre
É d’agua fria tremida
Ai azul como ele corre
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Na onda de um mar
Esquecido e por isso inútil
Pesco homérico os dias
Infindos e por isso mesmo
Pesco homérico os dias
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En la cancion ocre de mi alma
Discorre la lengua castelhana
Que no hablo nin escribo
Por isso la crio
En funcion de la tristessa
De me ocultar mudo
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Porque Hoje Não Há Solos
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Eliot
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Quarta-feira de cinzas, releio Eliot: “Because I do not hope to turn again/ Because I do not hope / Because I do not hope to turn / Desiring this man’s gift, and that man’s scope / I no longer strive to strive towards such things / ( Why should the aged eagle stretch its wings ) / Why should I mourn / The vanished power of the usual reign?”; ou como verte Knopfli, O poder extinto do costumado Reino? Hoje, a cinza reina pelo dia, anuncia os quarenta dias mais magníficos do ano. A imperatriz Primavera ( ou Spring ou fonte ou mola ) instala-se na sua usual leveza. Estou, sei lá, very british.
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Coltrane V. Ellington
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Chove desalmadamente e dolentemente ouço Coltrane e Ellington num diálogo tão absolutamente que nem requer adjectivo. Na bateria pontua Woodyard, que é um nome belíssimo, e me põe a pensar se pátio se escreve assim, se será um pátio-floresta ou uma mata longa, projectada.
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Lorca
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Quarta-feira de cinzas, hoje comecei a lamber Lorca de leve por causa de uma amiga, as coisas que ela me faz. Tenho de investir no espanhol, por causa das etiquetas. Há listas de ingredientes absolutamente intraduzíveis. Que me dan miedo, los tranggénicox. Ai, hablar com ella…
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Porquê ressuscitar? Porque não reparaisar? A mata do Eden perpetuamente vazia é de uma parvoíce cósmica. Ir para o céu? Eu quero é a terra negra, a erva verde do meu pai Adão. E que me desculpes, Eba, redá-me la costilla. Quê la necessito.
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Sexo e Vinho
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Estou com uma ressaca babilónica, antes da intervenção. Graças a Deus que nunca cedi à sodomia, senão a tragédia era tão extraordinária que não chegariam adjectivos, por subjectivos que fossem. Um plano inclinado instalou-se nos meus olhos, e uma espiral de enjoo e sede remete-me para um canto à boxeur esmurrado. Vai-me valendo a jazada, colheita de 62. Essa é inócua para as tripas, e espantosamente sem adjectivo.
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Belgais
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Viro-me para Mozart pelas mãos da Maria João ( Pires ), uma Senhora que nunca precisou de chávena para ter o chá completo. K.283, sonata para piano nº. 4, Mi Bemol Maior. Destilados austríacos, seguramente eficazes no combate à azia. E aqui, a culinária é portuguesa, e de uma pureza de execução que deviam matar gente assim. Mas depois morriam contentes, e não havia redenção para os pecados. Religion is a bitch.
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Pai Nosso
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Jesus prega-se daqui a quarenta dias, via-se nos billboards de Jerusalém, enquanto as oliveiras já então centenárias se mediam contra o céu anil que ainda não era a reforma dos crentes. Consegue alguém perceber a parvoíce de matar um filho só porque a mãe tinha dormido com um arcanjo e um carpinteiro? E ao que dizem, a do carpinteiro é boato? Religion is a bitch.
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Porque é Suposto Ser Longo
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Na minha maneira mineira de prospectar palavras, encontro, já veterano, algumas que são sagradas. Mais fácil o ser Indiano. Sagradas as vacas, chega. A palavra de Deus, escolhida a dedo para caber em quatro Evangelhos; O Om mântrico e o Jeová indizível. E as outras todas que não conheço. Não falando dos versos deste, das prosas daquele. A ladradela do caudilho, os floreados do fürer, as tarentelas do duce, a murmurada reza do men of holly comba. Um sarilho.
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Irmãs do rito, mas não do mito? A fala primeira é descritiva, necessariamente útil. Doí. Gozo. Comer. Beber. Quatro evangelhos, só aqui. E cria-se uma estória já: Porque me doía, quis prazer, comi e bebi. E enquanto esta estória se conta, surge, porque mímica é primeiramente gesto, o ritual de a contar. No pequeno passo desse Homem ( seria já um Homem? ) estão todos os passos, e por cima o da Lua, o faiscante holofote do primeiro palco.
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( Why should the aged eagle stretch its wings )? The Eagle, my friend, has landed.
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Parva
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Parece parva a insistência no escrever como se escrever fosse importante
Quando eu sei todas as linhas de todos os homens ardidas já
Pelo sol que sucumbe na sua fogueira finita
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Há na vacuidade da letra a arrogância dos Grandes
Há na insistência de uma memória fixa a simplicidade dos Crentes
No dia em que deixarmos de acreditar no lume
Morrerão de frio as letras mortas
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Até lá, Velha Águia, que nunca te cansem as asas
Nem o sol assassino das manhãs
Até lá, Assassinado, teme a memória do tricórnio
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Eu vou burilando os meus sonetos
Se me saírem sonetos demarcados
Que por vezes a intenção e essa
Mas os resultados colidem nos talentos
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Região pessoal, colheita minha
Parras d'Adão e anatomia
Ai Deus, inda não foste
Já nem tenho Ara, a fome foi-se
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Fim D'hoje
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Acabar o quê? Isto é rascunho, é suposto ser tudo começo. Mas vai para a rede, sem rede, por uma obediência ao código transtornado de em rede não haver crítica. E não há crítica, porque não foram criadas as credibilidades que a sustentam. Bom mau razoável? E as credenciais? Estamos a retira-las de um saber que não foi criado aqui. A rede foi colonizada, pelo menos nos ramos que conheço. É uma enorme cidade africana, onde uma pequena feitoria dita e suga. Isto é o Daomê. Apetece-me, só ligeiramente, uma guerra colonial. E aqui vales tu, Chico. Ainda vai tornar-se um imenso Portugal.
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Adenda
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Mendes
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Os poetas coroavam-se uns aos outros. Aceito a coroa, porque tu aceitaste a que te dei. Mais que isso, é demais.
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Adenda 2
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Agradecia, a algum leitor benevolente, possuidor de uma chave Castelhana, que me pusesse, à laia de comment, uma versão do que escrevi na última estrofe do Federico Garcia, com o fim único de a substituir. A co-autoria é garantida, os louros nulos.

Comments:
somos dois. hoje.


tb não me apetece.


só que tu não te apetecendo foste descrevendo. arcos e piramides...


lagos.



como só tu.


tb para que preciso eu de escrever

se te tenho a ti para reler lendo?



beijos.
 
o mendes é comigo? ou para quem?


e posso saber?


hei de voltar (e não é ameaça) para o teu Garcia Lorca....


talvez quando forem 5 da tarde.


___________________!
 
O mendes é para o Génio ( ou genial ) do outro dia. Sabes mais que isso.
 
Guten Morgen ... !!!
 
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