Outro Tempo

Porque às vezes mais não é suficiente

sexta-feira, junho 29, 2007

 
29º.

A minha cabeça decidiu que são férias de Verão. Nada a fazer, desligou e disse-me “Até Setembro! Saudades à Prima”. Assim ando decapitado, o que me dificulta a criação artística. Lamento, pois, senhores, a falta do recorte, do estilo, da técnica, e evitarei a escrita como o leproso o burgo. A minha atenção virar-se-á, em slow motion, para a contemplação, absorção, trituração e preparação, com fito único de, na volta da cabeça, cozinhar literatura.

Isto é Literatura? Fui ver o que é: É a arte de compor escritos artísticos; o exercício da eloquência e da poesia; conjunto de produções literárias de um país ou de uma época; carreira das letras.

Basicamente, parece correcto. Excepto a carreira das letras. Parece-me demasiado bélico. E embora tenha lido “A Arte da Guerra” e o “Da Guerra” respectivamente por Sun Tzu e Carl Von Clausewitz, não me impressionaram grandemente pelo conteúdo literário. A carreira deles também não era a Letra, era a Tropa, são maus exemplos; mas bons livros, sobretudo o primeiro. Voltando à definição, a arte de compor escritos artísticos, leva-nos à tipografia. E mais artístico que os tipos, não há. E aqui não há tipografia. Corrijamos para “alguns tipos artísticos, não todos, mas alguns”. Daqui a bocado não tenho definição; sigamos com cuidado. O exercício da eloquência e da poesia. Bem eloquente sou, e faço versos. Agora se fazem parte do conjunto, isso já não sei. Estão para lá.

Largando a wikipédia, olho agora para as “artes de síntese” que surgiram lá para os fins do Séc. XIX. O Cinema, que integrou a fotografia, a música, o teatro, a literatura; a BD, que integrou o desenho e a literatura. Um dia vamos ter de meter a internet nisto, estamos condenados, todos, a trabalhar na 10ª. Arte. O que não me soa bem. Deviamos descartar algumas das artes para mantermos o número razoável. Isto quando entra nos dois dígitos nunca mais pára.

Bloqueado entre três mundos
Estreitas as portas
O Eu
O Contigo
O Sem Ti

O vento levanta a esta hora
E deixa-me despido de ilusão
Concreto soprante vem de Norte
Torra-me o sol está frio

Ando vazio

Interlúdio Romântico

Vento

Depois da ida o regresso para a entrada o ingresso espectáculo da vida quem te encenou ele há dias que acho que és peça selvagem outras homenagem improvisada ao improviso outros marcha militar à civil fardado de cores foscas e ornado de luzes brancas. Assim, liso como a Ria sem vento mas há quinze dias que faz um vento cruel que já perdi a noção de liso, que já não sei de águas mansas. Voa por cima do Mondego um milhafre que não voava e ainda lhe não decidi o agoiro, aqui só voam espaçadas gaivotas, e há uma cegonha também nova nestes céus antes desertos dela. Para mim o vazio vem sempre depois do cheio, vazio é sempre algo que não era, e agora já não é, sou saudades e gosto, masoquista seria se gostasse, mas nada me dá gosto, hoje. Deve ser do vento. Sopra então repentino ou meigo, mas sopra; sê constante nesta equação irresolúvel, falha-me as contas por seres, acrescenta-te à minha banda sonora. Olha, sopra p’raí. Eu ralo-me, mas um ralar de cristão, de fé e mãos vazias, com preces ready-made e fé em tijolo burro ou de vidro para deixar passar a luz.

Fim D'hoje

Magritte dizia, a telas tantas, ceci n'est pas une pipe. Eu digo, nestas, afinal, páginas, que isto não é literatura. Não é, porque é mais. Aqui, o escritor é dono do espaço que o publica. Aqui, a crítica não chega. Aqui, quem gosta diz, quem não gosta abstém-se, aqui, não há comércio, e quando há, realiza-se lá fora. Aqui, o paraíso do ajuntador de letras, é-se escritor porque se escreve, e basta. Não sei quem me lê, quantos me lêem. Não sei, com honrosas excepções, se valho a pena. Apenas escrevo, e mando para o ar, e depois leio, e começo a escrever outra vez. Sem responsabilidade, sem dívida; apenas com vontade de surfar a frase.

Adenda

“Aos Livros outonais caem as folhas, aos estivais ardem retinas” Alphonse, O Vesgo, Séc. XII

Adenda 2

“Quem vai à Guerra, dá e leva” Mahatma Gandi

Adenda 3

“Ir e vir são exactamente iguais, com excepção do V” Dr. Tempo, aquando uma constipação violenta que o acometeu por andar a passear na Nortada.


quinta-feira, junho 21, 2007

 
28º.

A auto análise. A mesma síntese. O problema sou eu, o mundo e as danças do salão que nos coube. Ontem ouvia tangos pelas entradas da noite, mas não rodopiava. Estava estático a deixar bailar o som. Parei a música, e no ligeiro vibrar do imediato silêncio pareceu-me ver o pratear do Rio de La Plata, e o resmungo de Buenos Aires ( Querida ). O meu telemóvel toca o Libertango quando toca. Eu ouço o Libertango quando posso. E quando alguém se lembra de mim. Todos os que me falam são antecedidos por Piazzolla. Há uma liberdade enclausurada no Nokia. Todos os que me falam são ligeiramente Argentinos. Tenho uma tshirt com o surfista prateado. Mais Argentino não há.

Das danças que dançamos
Não me restou nada
Mas não era para isso
Que afinal dançávamos

Era a tontura e os olhos fixos

Era o corpo de som
Partilhar lugar
Sorver movimento
Apenas tanguear

Eram as mãos e as costas

Éramos par e tontura
Nas noites clássicas
A memória futura
Não existia ainda

Para onde vai a música quando vai?

Pela janela entra sorrateiro
Um fantasma de um teu cheiro
Já não danço
Faltas tu

Promenade

A melancolia, a saudade e a nostalgia foram fazer uma excursão a Lourdes. A melancolia enjoou, a saudade chorou, a nostalgia suspirou. Acenderam as três uma velinha à Virgem. Voltaram por Santiago. A melancolia constipou-se, a saudade comprou uma vieira, a nostalgia queria voltar a França. Acenderam as três uma velinha ao Santo. Acabaram em Fátima. A melancolia desmaiou, a saudade comprou um Rosário e a nostalgia adormeceu. Almoçaram bem com o resto do dinheiro. Prometeram começar a próxima excursão em Meca.

Dog

Ontem um cão na praia lembrou-me o teu. Encontrei um búzio enrolado na onda e não o trouxe. Era pequenino, não ia crescer mais, ficou. Mais ou menos como nós. Um grande cão cheio de paz ladra-me rouco. E sinto na perna esquerda uns dentes que deixaram de lá estar. Mais ao menos como uma espécie de Santo. O milagre da remoção dos dentes. Olha o cachorro louco, fofinho, cachorro louco vai virar um passarinho, olha o cachorro louco, legal, vai brincar, vai brincar no Carnaval…

Adenda

E se trocássemos a nau pelo now?

Adenda 2

Carlinhos Brown, Cachorro Louco, in Omolete Man ( ó ié! )

Adenda 3

Não sendo este sítio para fazer política nem esgrimir argumentos, não acreditando sequer que é o político o motor do económico, e ainda menos do social, há nesta nossa mátria um esforço deliberado para muscular a Democracia. Temos tradição no campo dos Capitães. Não dos Coronéis. E entre Tangos e Salsas, estou perfeitamente convencido que alguém perderá o pé. Esperemos que no processo não leve o que nos resta de pernas. O Sr. Engenheiro é um candidato a tiranete com manias de déspota mal iluminado. Farei, no que possa, parte do esforço para lhe apagar a vela.

terça-feira, junho 19, 2007

 
27º.

A pasmaceira instala-se na minha alma como um exército acampado à muralha. Estou cercado. Resta saber se estava preparado. Quando era pequenino fui escuteiro. Eu sei, é um estigma, mas fui. E não me arrependo porque, ainda sempre alerta, não me lembro se a decisão foi minha. Sei que o lenço era orgulhosamente amarelo, e era a única farda que tinha. O resto não me compraram os papás. Para parvoíce basta o lenço; fardados andaram os teus irmão com a farda da mocidade, agora não é obrigatório, só levas o lenço. O salazarismo seria mais justo para com as organizações de juventude?

Perdi o teu amor nas dobras do lenço
Como o anel fugidio de um compromisso vago
Acabei por perder o lenço, inevitavelmente
Para que o queria sem anel
Sem ter chegado ao dobrar dos sinos?

Olha a linda noiva
Olha eu
Desalinhado e sem lenço
Para limpar a cara
Para dobrar-me dentro

Numa memória enrolada
No esquecer amarrotado
No oco do anel
Amarelo

Receita

Pego em mim e esfolo-me. Não é necessário escaldar-me previamente, já ando para o morno. Cubro-me de água até ao pescoço, tempero-me a gosto. Saio cozinhado pela noite fora, como se fosse eu que fosse nas traseiras daquelas motinhas das pizas. Distribuo-me ao domicílio. Aceito gorjetas e dou bebidas se encomendarem em quantidade. Sou dose. A meia, essa é sempre preta. Manias. Ninguém me pega como usualmente. Tenho de comprar uma colónia corrosiva para atordoar as moças. Bebo um par de Jacks e volto para casa. A autofagia em excesso será perigosa para a qualidade dos produtos expostos? Provavelmente, mas já devo ser auto imune. Ou moto indigesto? Bem, pelo menos ando lavadinho.

Interludio Romântico ( a L. )

Da Matemática

Capaz de atar uma pedra brutalmente metafórica a este pescoço largo, lançar-me borda fora desta vida, ir. Voar baixo como pássaro cansado num horizonte baço, ave peralta aterrada em lodos, filho de lamas e de desejos baixios. Parecem-me as minhas mãos longe e as vontades básicas. Filho do desejo, abandonaste lar e esperança, e a caridade nunca olhou para ti, nem tu para ela.

Na nova matemática do ser, tu que nunca soubeste a conta, erras porque és, e mais não tens que uma soma de nadas.

Ver para lá da montanha, e compor em tipo raro uma prova tipográfica de um além possível. Saber-me sonho atormentado, pesadelo plácido. Ver no olhar de quem me quer o meu olhar de querer, amar perdidamente porque me encontro em ti. Fazer a pirâmide do verso pare me eternizar nela, e estar nela esperando a renovação da voz. Filho do sol a chuva molha-me de um desgosto etéreo, vão.

Na nova matemática do ser, tu que contavas pelos dedos, erras porque sim, e mais não tens que a consequência de agora.

Trepo a encosta porque a sei descida; no topo acendo o cigarro mais gesto que vontade; desço outra encosta porque a sei subida. A minha cidade corcovada chama-me e eu vou por ela palmilhante e doce. Sei as casas as árvores os pássaros e as pessoas; sei-a toda. E deixo-a vestir-me o verbo de som e cor, de vento e mais. A minha cidade ama-me porque eu sou dela.

Na nova matemática do ser, tu afirmas física, e filosoficamente erras.

Fim D’hoje

Costumo dizer que para haver muita cultura tem de haver muito estrume. No meu caso é rigorosamente verdade. Acredito, porque me apetece, em excepções. Vinícios e Toquinho rodam para ali, bossa. Vou mudar a onda Moisés dos meus discos. Monk & Trane. Hoje deu-me para os duos dinâmicos. Há uma saudade que me cobre os ombros como um xaile. As músicas tem forros como os casacos.

Adenda

“Olha a linda noiva, queria-se casar, mas ficou viúva, antes do altar” Acho que é Xutos.

Adenda 2

A força da maré
Desaba-me em castelos
Com vista para o mar
Esboroo-me em paisagens
Térreas

Adenda 2 bis

No plano inclinado
Areia e vento
Rolo seixo
E aceito
O necessário sal


segunda-feira, junho 11, 2007

 
26º.
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“O tempo não é um conceito empírico derivado de uma experiencia qualquer. O tempo é uma representação necessária que serve de fundamento a todas as intuições.” Parece que é Kant. Acho um completo disparate, mas parece que é. Há que respeitar, portanto. Mas acho que é um completo disparate. Apanhei isto como é costume, num sítio qualquer, onde as navegações nos levam, neste passear da bloguice, labiríntico e concreto, cheio de coisas bonitas e das outras cheio. Um Mundo. Quanto à frase de abertura, além de ser uma boa frase de abertura, não vejo porque é que o tempo não há de ser empírico. Sobretudo como conceito. Então empírico não é derivado dos sentidos? Então os conceitos vêm de onde? Não vou agora reler Kant, senhor que até prezo, mas derivar todas as intuições, por excelência sensoriais, de uma fundação temporal exterior ao mundo? Quer dizer, as intuições datam-se? Vou ter de reaprender Filosofia. Ou deixar de ler citações.
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O meu problema é vocabular, eu sei. E o original é alemão, ao qual não acedo há muito tempo. E o Sr. não dizia disparates. É o tal que nem levou a mulher a enterrar, tão preocupado estava a fundar a ONU, ou a CEE, ou uma coisa dessas. Mas quando li, não gostei. Primeiro, a experiência do tempo não é exterior ao Humano, é anterior, será posterior. Nunca exterior. Depois, não me parece que seja necessário para coisa nenhuma, quanto mais para as artes do palco. Uma peça sabe-se quando começa, não quando acaba, o que é bom. E Teatro Necessário é quase tão mau como Teatro Subsidiado. O Tempo enquanto representação? Não, a não ser que seja uma Revista. Que sublinha, que comenta, que se ri e faz rir.
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Quanto a ser fundamento de todas as intuições, teremos de intuir que todas as intuições são posteriores ao tempo. Mas não, há pelo menos uma que é simultânea. A intuição temporal. Do género “hoje vai fazer mau tempo”. Frágil, como Filosofia. Mas como ele devia estar a falar de Zeit, eu sei lá...
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Under a Bridge
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Sê uma espécie de ravina
A minha inclinação romântica
Quero pender para ti
Num desnível parco
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Amar enquanto sinto
De ti a ladeira e o degrau
Amar-te em desvantagem
Propositada miragem
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O metro passa a D. Luís
Lá muito em cima
Na noite não lhe vejo o amarelo
Mas sei-o
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Sê tu assim
A cor que sei sem ver
E sem te ter
Ó tu que passas
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Dissecação
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Tempo conceito empírico + experiência indiferenciada
Tempo = representação necessária = intuições
Conceito empírico representação necessária
Conceito empíricointuições
Intuição = conceito cientifico?
Tempo = Supra sensacional?
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Resumindo
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Alguem vai ter de dar uma refrescadela a Kant, e não vou ser eu, de certeza. Aceitam-se conselhos, caso já tenha sido dada.
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Interlúdio Romântico
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Porto
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Dado o salto sobre o precipício da alma
Num arco de gazela parabólico
A Arrábida convida-me sobre ela
E o céu é rosa, oiro, azul
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Rente ao Doiro, serpenteando ligeiramente bêbado
Embriaga-me este Porto sempre novo
Vintage regando o coração inquieto
Minha alma que balança entre dois pólos
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Gosto daqui um gosto velho
Do cinza do granito da luz velada
Mas com sol, com este sol
Parece-me ainda mais gosto o gosto antigo
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Fim D'hoje
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Não sei Filosofia. Mas sei que a Filosofia nasceu da disputa da ideia, e da procura de conceitos vastos que moderassem o Social, justificassem o Político, e servissem o Ético. Sei que citar é bom, correcto e necessário, mas também sei que citar porque é bonito pode ser chato. Citei a citação de alguém que citou. De onde? De uma folha esquecida no fundo de um gavetão? De um papel que era para acender a lareira? Ou o parágrafo fundamental do clássico que mudou o Mundo? Saber é acumular, e muitas vezes disparates. A maldade que eu fiz ( tentei fazer ) ao velho Kant é uma maldade de admirador mal servido. Como quando vamos aquele restaurante e não há o prato do costume e comemos o mesmo que havia em casa porque raio é que saímos kind of thing. Perdoem por isso, senhores, mas se saímos da caverna, provavelmente ainda temos barro nas botas.
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Adenda
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“O tempo não é um conceito empírico derivado de uma experiencia qualquer. O tempo é uma representação necessária que serve de fundamento a todas as intuições.” - Immanuel Kant – 1724 a 1770 – Gostava de salchichas porque não tinha alternativa, e de pensar porque não tinha televisão. Bom tipo. Um bocadinho chato, mas bom tipo.
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Adenda 2
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“O Tempo não é um conceito, nem pode ser conceptualizado. Não pode ser medido, nem pode, enquanto totalidade, ser instrumento de medida. É abstracto, como tal ilegível a luz do “normal”. Se um dia tiver tempo, explico.” - Frei Tuck, quando estava bêbado, à sombra de um vasto carvalhal, para uma galinha. Frei Tuck também gostava de salchichas.

terça-feira, junho 05, 2007

 
25º.
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Nesta rede as aranhas devoram-se umas às outras, e as poucas moscas que há voam velozes e iludem as teias, nunca satisfazendo os apetites. Canibais, vamos pulando, e sobrevivendo de vassalagens, umas sinceras, outras nem por isso. Esta rede, não me cansando, empurrou-me para um canto, onde nada de novo chega, e quando chega encontra a minha vontade velha. Estou, daqui a nada, a fazer dois anos de blogguer. Os anos de blogguer devem ser como os anos de cão, ou pior. Dois devem significar dez. Estou saturado. E de mim, ainda por cima. Nos últimos tempos, cada vez que escrevo, vou até um parágrafo. Depois não gosto, depois apago. Depois amuo e fico dois dias sem tentar, e de novo o paragrafo, e o apagar de novo, e já são quatro dias. A sensação que não tenho nada para dizer instala-se. E convenço-me. E sei que não tenho nada para dizer.
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Mas tenho o blog, este filho voraz, para alimentar. E tenho gente que gosta de mim a pedir que diga, que apenas diga. E tenho a minha vaidade de escribinha, e o gosto de mexer com a língua. E tenho o Tempo.
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Assim, vai de esforço, mas vai. Daqui, senhores, vai sair post. Não será dos melhores, mas sei que um dia conseguirei fazer pior. Peço-vos, pois, condescendência.
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Ontem fiz anos e a vertigem dos quarenta transformou-se em queda livre. Trezentos e cinquenta e cinco, and counting. Quero arranjar uma moça de vinte e um, primeiro porque já é maior, e depois porque posso dizer, e nem sequer tem menos vinte que eu. Quero um carro potente e veloz, porque já matei três que eram velhos e lentos, e estou farto de comboios com ar condicionado. Quero ir de férias para Nova York em Agosto, porque não há aviões para Vladivostock em Dezembro. E quero amar assim perdidamente porque conheci alguém que não amava a Florbela.
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Canção dos Anos
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Os anos acumulam-se em pó e pedra
Numa torre circular de vida e tempo
Sobem em escada escusa e degrau liso
E quando se tropeça não se cai
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Tu que me fizeste subir ao patamar
Tu que me disseste sobe
Sabias a escada condenada
A uma pena que o vento não sopra
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Ontem não soprei velas
Como quem as apaga apaguei os meus cigarros
Trinta e nove novos anos
E a alma um tudo e quanto amarga
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Interlúdio Romântico
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É Sexta
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É sexta de sol e logo vou ver o Sassetti. Gil Vicente a soar Jazz num três quartos de cauda que ali parece ter a cauda toda abençoado o traço de quem traçou aquela sala. Vou mais a Maria ouvir Alice que acompanhava um filme de ver que eu não vi; ouvi e fez-me chorar à beira Ria sentado num toco de eucalipto não são só as cebolas vegetais pluviantes. Tinha a cara cortada de ter caído mas chorava porque aquela Alice com a Ria plana como uma autobähn e coisas bicudas no peito me deram um suspiro a ouvir o piano e talvez o sol da manhã zurzindo no olho tenha ajudado, ou talvez eu queira querer que sim; hoje não choro. Vou ouvir Sassetti ao vivo a última vez que o vivo era ele e o Laginha e a Maria João e uma orquestra e o Gil Vicente abençoado o braço de quem traçou aquele canto. Também havia Maria naquele dia mas dá-me a impressão que ainda não havia Alice só Indigo, mas não digo de certeza certa; não houveram lágrimas, essas eram para depois, num até Jazz me parece agora, porque é quê as memórias se medem às músicas? A Maria chorou, mas não de tristeza, de alegria incontida sentida cá fora num lavar de rio de antigamente quando não havia máquinas de lavar por dentro. Os sacos lacrimais são metáforas bipolares ao contrário das nuvens que só choram quando aumenta a humidade e baixa a temperatura. Temperamentais para sacos, I say, não se remetem ao papel de contentores, viram-se por dá cá aquele vento, quer de Sul, quer Nortada. Abençoada então a música, a lágrima e pianos com cauda que nos fazem abanar a nossa numa alegria cachorra de ser sexta de sol e ir ouvir logo o Sassetti.
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( Porque Sexta-Feira fui ver o Carlos Bica e lembrei-me e porque houve um Piano que se calou )
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Fim D'hoje
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Quando eu acho que sou ingénuo, muitas vezes tenho razão. Já fui muleta de muito coxo, que nem sequer precisava assim tanto de muleta. Mas pronto, nessas alturas penso na bengala de castão de prata que o meu pai agora usa, e já foi usada pelos avoengos, e sei que, a ser muleta, o fui com estilo. Abençoado então quem me levou pela mão aonde queria ir. E que não tropece muito sem mim.
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Adenda
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Será que o Muro das Lamentações faz eco, e se sim, alguém lhe ouve as vozes?
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Adenda 2
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Parabéns a mim, porque os que me deram foram escassos, e eu queria mais. Mais parabéns!

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