27º.
A pasmaceira instala-se na minha alma como um exército acampado à muralha. Estou cercado. Resta saber se estava preparado. Quando era pequenino fui escuteiro. Eu sei, é um estigma, mas fui. E não me arrependo porque, ainda sempre alerta, não me lembro se a decisão foi minha. Sei que o lenço era orgulhosamente amarelo, e era a única farda que tinha. O resto não me compraram os papás. Para parvoíce basta o lenço; fardados andaram os teus irmão com a farda da mocidade, agora não é obrigatório, só levas o lenço. O salazarismo seria mais justo para com as organizações de juventude?
Perdi o teu amor nas dobras do lenço
Como o anel fugidio de um compromisso vago
Acabei por perder o lenço, inevitavelmente
Para que o queria sem anel
Sem ter chegado ao dobrar dos sinos?
Olha a linda noiva
Olha eu
Desalinhado e sem lenço
Para limpar a cara
Para dobrar-me dentro
Numa memória enrolada
No esquecer amarrotado
No oco do anel
Amarelo
Receita
Pego em mim e esfolo-me. Não é necessário escaldar-me previamente, já ando para o morno. Cubro-me de água até ao pescoço, tempero-me a gosto. Saio cozinhado pela noite fora, como se fosse eu que fosse nas traseiras daquelas motinhas das pizas. Distribuo-me ao domicílio. Aceito gorjetas e dou bebidas se encomendarem em quantidade. Sou dose. A meia, essa é sempre preta. Manias. Ninguém me pega como usualmente. Tenho de comprar uma colónia corrosiva para atordoar as moças. Bebo um par de Jacks e volto para casa. A autofagia em excesso será perigosa para a qualidade dos produtos expostos? Provavelmente, mas já devo ser auto imune. Ou moto indigesto? Bem, pelo menos ando lavadinho.
Interludio Romântico ( a L. )
Da Matemática
Capaz de atar uma pedra brutalmente metafórica a este pescoço largo, lançar-me borda fora desta vida, ir. Voar baixo como pássaro cansado num horizonte baço, ave peralta aterrada em lodos, filho de lamas e de desejos baixios. Parecem-me as minhas mãos longe e as vontades básicas. Filho do desejo, abandonaste lar e esperança, e a caridade nunca olhou para ti, nem tu para ela.
Na nova matemática do ser, tu que nunca soubeste a conta, erras porque és, e mais não tens que uma soma de nadas.
Ver para lá da montanha, e compor em tipo raro uma prova tipográfica de um além possível. Saber-me sonho atormentado, pesadelo plácido. Ver no olhar de quem me quer o meu olhar de querer, amar perdidamente porque me encontro em ti. Fazer a pirâmide do verso pare me eternizar nela, e estar nela esperando a renovação da voz. Filho do sol a chuva molha-me de um desgosto etéreo, vão.
Na nova matemática do ser, tu que contavas pelos dedos, erras porque sim, e mais não tens que a consequência de agora.
Trepo a encosta porque a sei descida; no topo acendo o cigarro mais gesto que vontade; desço outra encosta porque a sei subida. A minha cidade corcovada chama-me e eu vou por ela palmilhante e doce. Sei as casas as árvores os pássaros e as pessoas; sei-a toda. E deixo-a vestir-me o verbo de som e cor, de vento e mais. A minha cidade ama-me porque eu sou dela.
Na nova matemática do ser, tu afirmas física, e filosoficamente erras.
Fim D’hoje
Costumo dizer que para haver muita cultura tem de haver muito estrume. No meu caso é rigorosamente verdade. Acredito, porque me apetece, em excepções. Vinícios e Toquinho rodam para ali, bossa. Vou mudar a onda Moisés dos meus discos. Monk & Trane. Hoje deu-me para os duos dinâmicos. Há uma saudade que me cobre os ombros como um xaile. As músicas tem forros como os casacos.
Adenda
“Olha a linda noiva, queria-se casar, mas ficou viúva, antes do altar” Acho que é Xutos.
Adenda 2
A força da maré
Desaba-me em castelos
Com vista para o mar
Esboroo-me em paisagens
Térreas
Adenda 2 bis
No plano inclinado
Areia e vento
Rolo seixo
E aceito
O necessário sal