38º.A espuma branca corre-me aos pés mergulho as mãos a concha o cabelo as sobrancelhas o sal na boca o pescoço de repente frio, esfrego as carótidas e os pulsos, os pés submersos afundam na pasta de areia o mar está daquela cor que às vezes é a dos meus olhos. Um dia, entre contas indiscretas soube que os meus nove meses começavam em Setembro, por isso sei que foi aqui, talvez frente a este mar que começou o desejo que me trouxe. Ouve cinco antes de mim, e o primeiro desejo sei que é mais de Sul, e até sei nomear a terra do primeiro olhar, mas o meu, se não falhou a conta, é daqui. O meu amor a este mar é sabe-lo pai primeiro, o gosto desta onda é sabe-la mãe antes?
Murmura, quase canta a água a entornar-se sucessiva na costa fito o sol e uma bênção de paz serena, de meiguice despojada veste-me o tronco nu arrepia-me primeiro o nariz depois a espinha e a sensação de uno com o mundo acentua-se. Faz-me falta o toque. Finco os pés na areia e incomodo um seixo com a ponta dos dedos, sei de peles mais frias, bocas mais mudas. Não me falta mais nada. E não tenho nada para dar. Não haverá frutos em Junho.
O teu amor sabia-me a pouco
Quando acabou sabia-me a nada
Haverá ainda algum amor para dar
Haverá ainda vontade de amar?
Um tempo de retornar
Ilude-me em miragem fria
Não sei de onde vim
Sei para onde não quero voltar
Interlúdio Romântico
Hoje não há.
Fim d’hoje
Amanhã há mais.
Adenda
“Sonhar o impossível, concretizar o belo, amansar a esperança” Dr. Tempo, quando soube que ia para Dr. outra vez.
Adenda 2
“A tonelagem de um navio é visível quando se pesa a totalidade da equipagem e o desgaste do motor de vante” Zé Marinheiro, Português de Braga, aquando adquiria um canudo numa loja do Chinês, dealbar da centúria corrente.
Adenda 3
“Vou comer ideias
Pagas em Propina
Restaurar as meias
Jantar na Cantina
Cantar o bom fado
Em altiva voz
Um pouco tocado
Com as mãos no cós”
Popular, in “Cancioneiro das Beiras, Sobretudo das do Meio” Edições Palimpsesto, Sangalhos, 1981 ( ó ié )